“"Imagine-me como uma alavanca em um pátio ferroviário muito complexo, onde os trens se dividem, se fundem e, às vezes, descem rapidamente para os poços. Todos os trilhos eventualmente vão para o mesmo lugar. Até os poços vão para lá. Mas você pode seguir muitos caminhos para chegar a esse lugar. Preciso que você pense em mim dessa forma para que possa me operar. Para que você possa fazer escolhas. Porque a verdade é que estou perdido. Estou muito longe do pátio ferroviário. É preciso voltar ao trabalho."”
-O “Endstone”.
Sempre que termino de ler uma nova lore de Magic: The Gathering e me preparo para escrever nossa tradicional review trimestral, sigo um ritual bem específico: tomo um banho quente e demorado, no escuro. É ali, na penumbra e em meio aos meus pensamentos, que organizo minhas impressões de forma lógica e concisa. Hoje, ao finalizar o último episódio de Edge of Eternities, repeti o mesmo processo. No entanto, quanto mais refletia sobre o que acabara de ler, mais estupefato eu ficava. Edge of Eternities é especial — não necessariamente boa ou ruim, mas definitivamente diferente.

O gênero de aventuras espaciais sempre foi algo neutro para mim. Definitivamente não sou um fã — como sou, por exemplo, de histórias como Thunder Junction e Bloomburrow —, mas também não chego a rejeitá-lo, como acontece no caso de Duskmourn. Acho que é um gênero com potencial, tanto para discussões grandiosas quanto para bobagens sem tamanho.
Adoro terror cósmico — uma das poucas abordagens que realmente me agradam no gênero — e já assisti a todos os filmes da franquia Star Wars, sendo Rogue One o meu favorito. Por outro lado, não gosto muito das perseguições com espaçonaves nem das guerras de laser em que ninguém acerta ninguém.
Dito isso, sinto que pude aproveitar Edge of Eternities sem qualquer preconceito. E, como mencionei antes, fui surpreendido. Mas será que isso basta para consagrar uma boa história?
Neste texto, trago minha review da lore de Edge of Eternities, apontando seus melhores e piores momentos e apresentando meu veredito sobre a qualidade da narrativa. Vale lembrar que este é um artigo de opinião e, portanto, reflete minhas preferências e gostos pessoais. Caso você discorde, sinta-se à vontade para deixar um comentário educado com seus argumentos — assim podemos enriquecer a discussão.
Dito isso, vamos explorar uma nova fronteira
- Um Cinturão de Asteroides.
Edge of Eternities tem um começo bobo.
A história começa com a tripulação da Siriema — ou o que restou dela — realizando um serviço para alguém que claramente não sabemos que é o Tezzeret, enquanto procuram por seu gato, Mirri. O problema: o resto da história segue mais ou menos essa mesma linha.
Sinto que houve uma tentativa de emular a vibe de Han Solo e Chewbacca com a dupla de protagonistas, Sami e Tannuk, ou até mesmo algo que remetesse aos Guardiões da Galáxia: transformar a tripulação final da Siriema em um grupo de foras-da-lei ao mesmo tempo sérios e engraçados. O problema é que essa proposta não me parece ter sido bem executada.
Mesmo construindo momentos de tensão e discussões religiosas e filosóficas, os personagens apresentados não são interessantes o suficiente para que eu conseguisse me apegar a eles. Tannuk talvez tenha sido meu personagem favorito — e ainda assim tem um papel coadjuvante, se comparado a Sami, Haliya e Alpharael.

Outro fator que joga contra essa história é o quão mal explorados são os elementos apresentados. Temos toda uma introdução ao universo de Sothera, mas quase nada disso é realmente aproveitado para construir os personagens ou aprofundar a narrativa. Sinto que essa é uma história sobre a qual eu preferiria ler no Guia de Planeswalkers, e não na lore principal em si. Mesmo sendo uma das maiores histórias dos últimos anos, como 11 capítulos, eu senti que faltou muita coisa a ser explorada. Contudo, esse ponto tem seu lado positivo, que irei falar um pouco mais a frente.
Algo que também me incomodou foi ter de concordar com alguns dos fãs mais conservadores: esta não parece ser uma história de Magic. Desde o início, Magic: The Gathering se destacou por misturar magia e tecnologia de maneira única. Como o próprio nome indica, este é um universo onde a magia ocupa um lugar central. Pois bem, Edge of Eternities vai completamente na contramão disso, apresentando uma história que soa fora de tom com o restante do multiverso. Pelo menos em Thunder Junction as armas eram pistolas mágicas. Não vou queimar essa pauta ainda, pois em breve discutirei a questão dos IPs e Universe Beyond, mas acho engraçado como em 4 anos a ideia de um set em que magia fosse algo menor foi de um 9 na Escala Rabiah para um acontecimento.

- Uma Nova Fronteira.
Se, quando errou, Edge errou feio, quando acertou também foi grandioso. Muitas vezes, saber como contar uma história acaba sendo mais importante do que a própria história em si. O dom da oratória permite que um conto simples se torne um épico — e o contrário também é verdadeiro: uma boa história mal contada pode se tornar desinteressante. Quando se trata de narrativas, não existe apenas o conteúdo, mas também a forma.
Contando um pouco mais sobre meu processo criativo: ao ler as lores de cada coleção, costumo ouvir os podcasts lançados na página oficial da Wizards no Spotify, como forma de manter o foco naquele conteúdo. Todavia, com Edge of Eternities foi diferente. Parte do “charme” dessa lore está no fato de que, ao ler, você podia fazer escolhas — assim como em um jogo. Embora essas escolhas não afetassem diretamente o resultado final da história, elas guiavam o enredo por caminhos alternativos que, invariavelmente, voltavam a um ponto de estabilidade anterior — um presságio do verdadeiro poder da Endstone.
Além de ser um belo presente quando finalmente compreendemos quem é e do que é capaz o narrador do início da história, essa “brincadeira” demonstra na prática o principal conceito de Edge of Eternities: o tempo convergente.
Uma das características mais fascinantes do multiverso de Magic: The Gathering é como cada plano — ou, neste caso, não-plano — é único e possui sua própria metafísica e regras. Ao contrário de outros mundos, nos quais a viagem no tempo tem efeitos previsíveis, em Edge of Eternities o tempo não é linear, mas convergente. Na prática, o que isso significa? Que nossas escolhas não mudam o destino final, mas sim o caminho até ele. No fim, o resultado é o mesmo — o que muda é o percurso.
Todos nós sabemos — ou deveríamos saber — que o ser humano, o Homo sapiens, sendo uma espécie em um cenário em constante transformação, está sujeito tanto à evolução quanto à extinção. É certo que, em algum momento, deixaremos de existir como espécie, seja por evoluirmos para algo novo, seja por entrarmos em colapso. A questão não é se, mas como isso acontecerá.
Compramos tempo nos últimos séculos — e agora, de certa forma, estamos roubando esse tempo de outras espécies. A pergunta é: que tipo de jornada faremos até a nossa extinção? Talvez alguns de vocês achem que estou sendo pessimista, mas a verdade é que o fim é a única certeza. O belo mistério está em como ele virá.
Como história sobre viagem no tempo, Edge of Eternities acaba sendo muito melhor que tudo que já consumimos no nosso jogo ate agora, mesmo que sem uma viagem propriamente dita.

Outro ponto interessante foi a forma como vários elementos foram apresentados — ou deixados de ser apresentados — ao longo da obra. Como mencionei anteriormente, muita coisa foi deixada de lado enquanto éramos introduzidos ao sistema de Sothera. Mas, neste caso, acredito que isso tenha sido proposital.
O universo é cheio de segredos — e Sothera também é. Quem é, e o que exatamente é Sami? Quais são os verdadeiros motivos de Tezzeret? O que acontece em cada planeta? Por que o Pinnacle existe?
Edge nos deixou, ao final, com mais perguntas do que respostas — e, para mim, esse é justamente o charme da história. Eu quero voltar para Edge of Eternities. Não apenas por seu visual deslumbrante, mas porque quero respostas. Quero conhecer mais desse universo tão peculiar e único. E esse desejo foi cuidadosamente construído em mim pela narrativa dessa lore.
Dessa forma, o ponto forte de Edge of Eternities não são seus personagens, que são bem esquecíveis. O verdadeiro destaque está em como o cenário foi construído. Eu sei qual é o fim dessa história — mas agora quero entender como chegaremos até ele e o que perderemos no caminho.

- Conclusões e Reflexões
Chegando ao fim da exposição das minhas impressões, é hora de avaliar o que achei dessa história.
• A categoria personagens recebe uma nota inédita até então: 1/5. Honestamente, fica muito fácil avaliar esse aspecto quando temos cinco personagens principais e, no fim, só consigo lembrar o nome de dois. Como já comentei, essa não é uma história sobre seus atores. Qualquer um poderia ser o herói aqui — não há nada que os torne realmente especiais, exceto o fato de que foram eles que acabaram nesse papel.
• A categoria mundo subverteu minhas expectativas e recebeu um 4/5. Para uma história que não se passa em um lugar específico, Edge of Eternities apresenta uma coletânea de locais, sistemas e mitologias muito próprias. Quero saber mais sobre o planeta vermelho e os Kavus; adorei a existência antagônica de facções religiosas que interpretam o fim de uma estrela de formas distintas. Como dito na introdução dessa lore, este é um canto do multiverso onde cultura, costumes e passado parecem importar — e isso é fascinante. Para mim, essa história me remeteu muito à animação Final Space, onde o mistério importa bem mais que a aventura em si.
• Infelizmente, a categoria enredo encerra a análise com uma nota de 1/5. Esta é uma história que se sustenta mais pelo seu potencial futuro — do qual estarei atento e ansioso — do que por sua força no presente. Se em 4 ou 5 anos anunciasse uma continuação dentro do sistema Sothera, eu estaria mais animado do que se tivesse de ler essa história novamente.
• Dessa forma, Edge of Eternities fecha com uma nota final de 2/5. Não é uma história excelente, mas apresenta potencial para se tornar algo grandioso no futuro.
No meu próximo artigo, abordarei um tema polêmico: os IPs e o Universes Beyond. Será que deveríamos realmente odiar tanto essas novas abordagens? Dando um pequeno spoiler da minha opinião: não. Mas isso é pauta para outra conversa.
Falando em nossos companheiros, peço que me ajudem nessa empreitada compartilhando esse e outros textos meus com seus amigos. Deem também uma olhada nos meus artigos na LigaYuGiOh! e conheçam um pouco da Lore desse jogo incrível.
Também ficaria honrado em ter a participação de vocês na sessão comentários deste artigo. Como sempre vou deixar uma pergunta para vocês: Qual sua hsitoria de espaço preferida?
Um grande abraço a vocês e até o mês que vem!
Deixando aqui minha critíca, em um ano que essa será a última, pois essa é a última coleção com lore do ano, uma lore tão distante do universo de magic, não sou anti-universes beyond, mas acho um desdenho com a lore.
Que beleza em...
Aliás, concordo com as afirmações de que muitas histórias hoje não tem mais "arestas afiadas". Parece uma síndrome de "Peppa pig", onde não sabem mais fazer "Animais do bosque dos vinténs".