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Nêmesis - Fantasma
Capítulo 12 da saga.
10/02/2019 11:05 - 2.184 visualizações - 10 comentários
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NEMESIS - CAPITULO 12

 

 

Sob o passadiço principal que levava à Fortaleza, o remanescente da Força Expedicionária de Skyshroud se organizavam, esperando ordens de Greven il-Vec. O Predador sobrevoava a planície procurando por inimigos. A nau voadora tinha atacado diversos grupos de rebeldes no dia anterior, liberando tropas ao lado – e algumas vezes entre – o inimigo atordoado. Essas pequenas ações foram suficientes para restaurar a moral do exército e, com ou sem Crovax, eles marchariam para a Fortaleza como um exército, não como uma turba derrotada.

 

Um pérchero pousou no ombro de Greven. “Urgente do Predador. Urgente do Predador!"

 

Ele odiava aquelas criaturas de pele de couro e estridentes.

 

“O que foi agora?”

 

“Intruso desconhecido! Intruso desconhecido” - Greven pegou a criatura pelo pescoço.

 

O coração do pérchero vibrou descontroladamente.

 

“Aterrissar no Monte dos Três Dedos. Encontrarei vocês lá.”

 

Greven gritava ordens para Nasser.

 

“Leve os homens para as barracas. Enviei os feridos para os curandeiros, então confine todos aos quartos até que retorne.”

 

“Problemas?”

 

Ele não tinha menor ideia de como responder, “Não.” O Monte dos Três Dedos era um promontório de quarenta pés de altura a meia milha a leste do passadiço. Havia um amplo buraco largo, mas raso, abaixo da colina onde a aeronave poderia pousar sem ser vista no chão. No momento em que Greven andava lá, não havia kerl grande o suficiente para carrega-lo, então o Predador teve que esperar.

 

O contramestre da nau, Narmer, estava esperando no solo por Greven. Ele correu assim que avistou a silhueta do comandante no topo da colina.

 

“O que é isso de intruso? Não conseguem lidar com um homem a pé?”

 

“Há mais do que isso, Senhor do Pavor.” Narmer parecia inquieto. “Pensei que isso deveria ser levado a sua atenção imediatamente.”

 

“Está bem. Vamos encontrar esse intruso.”

 

Narmer colocou a mão no peito do guerreiro monumental. Greven ficou francamente surpreso que o contramestre ousou tocá-lo...

 

“Não há necessidade, Senhor do Pavor.”

 

“O que? Como não?”

 

“Nós o pegamos,” Narmer apontou para o Predador, flutuando alguns pés acima do solo. Uma figura apareceu na balaustrada, profundamente vestida na sombra da colina atrás deles. “Ele deseja falar com você.”

 

Greven caminhou lentamente até a escada de corda pendurada. Por uma das poucas vezes na vida, ele realmente experimentou o sentimento de terror. A figura sombria se inclinou sobre a balaustrada. Como os olhos de Greven estavam acostumados a escuridão, ele viu o rosto do intruso.

 

* * * * *

 

“Eladamri, você está louco.”

 

Darsett en-Dal e o círculo interno da rebelião estavam sentados na grande sala do lar de Eladamri. Seu anfitrião estava sentado no chão, casualmente talhando um bloco de madeira.

 

“Digo com todo respeito”,  Darsett acrescentou quando ninguém apoiou sua opinião. “O que quero dizer é, esse seu esquema parece mais desesperado do que as circunstâncias requerem.”

 

“Fui caçado pela nau voadora por anos”, Eladamri replicou. Ele marcou um buraco no final do graveto e assoprou as lascas soltas. “Minha esposa morreu num ataque aéreo. Nenhuma rebelião pode continuar com essa máquina voadora voando sobre nós, espionando tudo o que fazemos e fazendo chover morte lá de cima.”

 

“Com certeza, Eladamri, mas por que você deve ir nessa invasão. Como sabe que Greven il-Vec não matará você lá?” disse Tanta Jova.

“Eu o conheço. Se ele pensar que pode por as mãos em mim, me matar será a última coisa que fará. Greven vai querer saber todos os detalhes da  rebelião, incluindo os nomes dos meus aliados. Em todo caso, ele me manterá vivo, por um tempo. É tudo do que preciso.”


Nas últimas semanas, Eladamri envelheceu consideravelmente. O duro e determinado elfo que ele fora, deu lugar a um contemplativo e quase melancólico elfo. Ele não vestira um elmo desde o encontro com o Oráculo en-Vec, andando com o cabelo comprido e preso num rabo de cavalo. Linhas profundas entalhavam seu rosto e seus olhos traíram um cansaço nunca antes apresentado.


“Queria que deixasse que alguns de nós fossem com você,” Gallan disse.
“Isso seria extremamente perigoso. Não há elfos no exército do evincar, e minha escolta deve se passar como soldados de Rath.”

 

“Não há mulheres no exército de Volrath também, e ainda assim está levando Lin Sivvi com você!”


“Sivvi é a melhor lutadora do meu clã,” protestou Tanta Jova. “Ela é uma adepta do totem-vec.” Esta era a única combinação de arma, faca-chicote, usada somente pelas mulheres guerreiras na sociedade dos Vec. “Não estou feliz com a escolha de Eladamri, mas me sinto melhor em meu coração se Lin Sivvi ir com ele até a Fortaleza.”


“Está acertado,” Eladamri disse. Ele deslizou as duas metades do fetiche que ele esculpira. Um pouco de cola e as juntas seriam invisíveis. “Partiremos amanhã, ao por do sol. Temos uniformes e equipamentos capturados o suficiente?”
“Suficiente para um regimento. Há um excesso de roupas de oficiais. Todos podemos ser oficiais de Rath se quiser. Eles morrem com muita frequência.”


“Se eu aparecer na Fortaleza como o prisioneiro de dez oficiais, eles ficarão um pouco desconfiados. Seria melhor se vocês fossem como os mais baixos dos soldados rasos. O plano de Eladamri precisava de dez guerreiros escolhidos a dedo, retirados de seus aliados Dal e Vec para usarem os uniformes de Rath. Eles caminhariam até a Fortaleza com Eladamri como seu prisioneiro e o apresentariam as autoridades lá.


Uma vez dentro da Fortaleza, eles encontrariam onde o Predador estaria atracado o destruiriam. Gallan e Tanta Jova ajuntariam o exército rebelde, agora, quase onze mil, e quando Eladamri e seu grupo retornassem, uma guerra em grande escala começaria na Fortaleza.


“E se você não encontrar o Predador atracado, esperando por destruição?” perguntou Gallan.


“Então esperaremos até que retorne.”


“E se Greven o matar antes que a aeronave retorne?”


Eladamri ficou silencioso por um momento enquanto ele abria um buraco na metade superior da imagem que estava fazendo. Ele lambeu o final de um pedaço de corda e enfiou pelo buraco.


“Esta guerra não é sobre mim, Gallan. Entenda isso agora. Quer eu viva ou morra, isso não é a rebelião de Eladamri. Ela pertence a cada pessoa livre de Rath, não a mim. Se eu morrer nessa operação ou em outra, vocês devem continuar lutando, me entenderam? Do contrário, tudo pelo o que lutamos se torna apenas vaidade, uma luta vazia por glória. Jurem que continuarão a luta não importa o que aconteça?”
“Está jurado,” disse Tanta Jova. 


“Juro,” disse Lin Sivvi.


“Você é um tolo. Um intrépido e dedicado tolo que estou feliz de conhecer. Também juro.”


Gallan estava sozinho. Todos na sala viram ele lutando para pronunciar as palavras.


“Juro continuar lutando. Mas se você morrer, também juro não mostrar misericórdia a Crovax, Greven il-Vec, ou qualquer líder da Fortaleza. Todos morrerão – pela minha mão se for necessário.”


Eladamri continuou esculpindo. A pilha de raspas brancas aos seus pés ficou maior.

* * * * *

“O exército de Crovax retornou,” Ertai disse.


Ele estava de pé em uma das estranhas janelas do aposento do evincar. Lá embaixo, ele podia ver os soldados se ajeitando em direção a cidade Dal, localizada na borda da muralha da cratera. À noite, se espalhou notícias sobre o massacre e dos problemas em todos os assentamentos. Nada importante – nenhum ataque a Cidadela foi feito – mas pequenos bandos de moradores indignados da cidade, percorreram as ruas à noite toda. Alguns moggs foram mortos e alguns grupos de soldados atacados, mas quando a guarnição da Cidadela retornou, os causadores de problemas foram embora. O conhecimento de que Crovax e Greven estavam de volta, acalmou os ânimos dos cidadãos que procuravam por revoltas.

 

Dentro da Cidadela, uma mentalidade de sítio tomou controle. Patrulhas constantemente circundavam dentro da fortaleza, garantindo que todas as entradas estavam seguras. Dorian il-Dal estava prostrado depois de presenciar o resultado da vingança de Crovax, e ele abandonara seus deveres regulares. Temendo por assassinatos, cortesãos se trancaram dentro de seus aposentos. Belbe se retirou para os aposentos do evincar. Antes disso, Ertai se ajuntara a ela, cheio de pergaminhos retirados da biblioteca da Cidadela.


Eles falavam pouco. Ertai arrastou uma cadeira até a janela e lia lá, olhando casualmente o que estava acontecendo. Belbe estava numa das cadeiras de Volrath.Após uma noite inteira sentada lá, ela finalmente falou.


“Estou com medo.”

 

“Por que você está com medo? Você é a emissária de Phyrexia. De todos aqui, você é provavelmente a que está mais segura. Ninguém ousa machucar você.”


“Talvez tenha usado a palavra errada. Nunca me senti assim antes. Acho que é medo.”


“Medo do que?”


“Machucar alguém.”


Ertai saiu da cadeira e se inclinou sobre o braço da cadeira de Belbe.


“Está com medo de machucar alguém, não de se machucar?”


“Sim.”


“Quem você está com medo de machucar?”


“Crovax.”


“Pelas cores! Por que estaria com medo disso?”


“Porque quero machucá-lo. Penso nisso todo tempo. Quero quebrar seus membros, arrancar seus olhos, desmembrá-lo, castra-lo-”


“Já entendi. Ninguém choraria se você matasse Crovax.”


Ela apertou a mão dele com força. “Escute o que digo! Quero machuca-lo, e quando eu o fizer, vou machuca-lo novamente. Matá-lo seria misericórdia. Não quero que ele encontre misericórdia alguma.”


“Belbe, minha mão-”


“No começo, as imagens eram apenas fugazes. Podia me distrair com outras coisas. Nos Salões Oníricos quebrei o registro de sonhos de Volrath porque realmente eu queria quebrar a cabeça de Crovax.”


Os dedos dela estavam se afundando na carne dele. Ertai tentou soltar seus dedos, mas até seus músculos recém crescidos não eram páreos para a força aprimorada de Belbe.


“Eu não devia me importar com o que Crovax faz contanto que sirva ao propósito dos meus mestres. Seus métodos são brutos, mas ele é o candidato mais forte para evincar. Por que não o nomeio para o cargo e parto? Eu tenho os meios. Não sou responsável pelo povo daqui. Será porque sei que Crovax matará cada ser vivo neste mundo para alimentar seu apetite por destruição?”


Ertai fechou o punho e acertou Belbe tão forte quanto pôde na mandíbula. A cabeça dela foi para trás, e por um breve momento ele viu a luz de ódio nos olhos dela. Seu coração se encolheu numa bola dura e um vazio se abriu na boca do estômago. Belbe deve ter visto a expressão de medo no rosto de Ertai por isso o soltou abruptamente.


Ele recuou rapidamente esfregando a mão dolorosamente machucada.


“Me desculpe. Não quis machucar você, Ertai.”


“Espero não estar por perto quando você quiser machucar alguém,” ele disse com tristeza. Seu humor mudou rapidamente. “Você realmente tem uma maneira de sair de Rath?”

 

“Mas é claro. Não posso permitir que você se vá.”


“Mesmo que isso signifique que Crovax me mate?”


“Sim.”


Ertai andava de um lado para o outro.


“Você sabe que não posso competir com ele para o cargo de evincar. Embora meu conhecimento e talento o superem, não sou páreo para ele em poder bruto.”


“Ninguém pode. Crovax se alimenta em cada morte. Toda vez que alguma coisa morre perto dele, ele absorve sua força vital, aumentando seu poder. Combinado com sua luxúria inata por destruição, ninguém conseguirá detê-lo.”


“Desde quando sabe disso?”


“Ficou claro ontem. Fiquei tentando determinar o porquê do seu poder continuar crescendo, apesar dos erros que ele comete. Então percebi que suas modificações em Phyrexia foram amplamente neurológicas, não mecânicas. Embora tenha sido dado a ele músculos e tamanho aprimorado, as mudanças mais importantes foram feitas por dentro. Ele ainda come comida como um ser normal de carne, mas é apenas um hábito que ele ainda não abandonou. Seu domínio pela rochafluente cresce exponencialmente. Não vem de costelas raras e vinho azedo. Certamente ele tem outra fonte de poder.”


“Então percebi o que estava acontecendo – a morte de vários soldados no campo de batalha alimentou Crovax com energia o suficiente para fazê-lo se teleportar pela primeira vez, do campo de batalha até a Cidadela. O massacre dos reféns aumentou seu poder mil vezes mais. Logo ele será imbatível. É por isso que quero machucá-lo.


Quero que ele saiba como é sofre nas mãos de outro.”


Por um momento, Ertai esqueceu de escapar. “Por que você não o mata? Ele nos matará se ficarmos em seu caminho.”


“Devo colocar o melhor candidato possível no trono de Rath.”


“Por quê?” ele berrou. A rochafluente ao redor dele se ergueu em centenas de pequenas lanças.
“É o meu propósito. A razão de existir.”


“Tenho uma razão para você, Belbe. Exista por si mesma! Lealdade é um traço admirável, porém você não pode se apegar a isso diante da destruição!”


“É por isso que você e seu tipo sucumbirão – vocês pensam por vocês mesmos, suas próprias preocupações mesquinhas acima do bem-estar da sua raça! Meus mestres destruirão você e quem mais ficar no caminho deles. É a lei da natureza que os eficientes substituirão os ineficientes...”


Ertai, gentilmente, ergueu a mão dela e a segurou com a sua. “Você é da mesma raça que a minha. Você não tem causa comum com seres cujo único propósito é forçar pessoas como nós a escravidão.”


O toque dele era firme e quente. Belbe o encarava, encarava suas mãos. Ela soltou a mão de Ertai e se virou.

 

Ele colocou seus braços ao redor dela. Diferente de Crovax, o toque dele era gentil.

 

“Por que você sempre se vira no último momento?”


“Não posso fazer o que imagino.”


“Por que não? O que detém você?”


“Não estou sozinha e nunca estive. Há um... dispositivo em meu corpo que transmite tudo o que vejo para meus mestres em Phyrexia.”


Ele virou o rosto de Belbe para ele. “Onde está o dispositivo?” Ela pegou a mão dele e pressionou a ponta dos dedos no esterno dela. Ele sentiu a superfície curva das Lentes encaixadas lá.


“Pode ser removido?”


“Talvez em Phyrexia. Não aqui.”


Ele fechou seus olhos e sondou as Lentes com sua mente. Tocando-a, psiquicamente, era como entrar num vasto poço vazio, negro e sem fim. Parecia não ter fim, se estendendo por todo o caminho de Rath até o plano secreto dos soberanos.


Belbe colocou a cabeça dela nos ombros dele.


“Essa coisa poderia me engolir por inteiro.”


“Poderia quebra-la ou bloqueá-la? Pelo menos por um momento?”


“Hmm, talvez. Seus mestres não suportam a força da vida natural, certo? Talvez se eu enviar uma carga dessa energia dentro do dispositivo isso os cegará.”

 

Ele colocou as mãos sobre o encaixe do orbe e invocou toda magia natural que pôde até alcançar este mundo não natural. Belbe sentiu um acumulo de calor no peito. Não queimava, mas lentamente se difundia pelo pescoço, braços e abdômen. Ertairemoveu as mãos.


“Funcionou?”


“Não há como ter certeza.”


Ela colocou os braços ao redor do pescoço dele. “Não me importo mais. Estou farta de ser uma lente. Quero estar sozinha com você, mesmo que seja só por um momento.”

 

* * * * *

Após algumas horas nos braços um do outro, Ertai estava exausto e Belbe absorvia de suas emoções tempestuosas. Enquanto ele dormia, ela o observava, respirando profundamente. Seu cabelo era castanho avermelhado agora, e ao lado de sua pele pálida, o cinza crescente de sua carne era bastante perceptível. Ele realmente estava começando a parecer com uma versão menor de Greven il-Vec.


Belbe se levantou, com cuidado, para não acordar seu amante. Ela estava fria, e embora tenha tentado dissipar a tontura nas pernas, ela descobriu que não poderia.


Isso a deixou pensativa até que ela decidiu que devia ser efeito do feitiço de Ertai. Seu sistema Phyrexiano não foi projetado para lidar com magia natural, e a perda do seu controle metabólico era provavelmente devido a presença da carga mágica em seu sistema. Ela olhou de volta para Ertai, que estava nu e dormindo. Tinha valido a pena.

 

No dormitório de Volrath, ela parou diante do espelho. Seu cabelo estava bagunçado, rosto corado e os lábios machucados. Estas eram as coisas superficiais. Belbe se aproximou mais do espelho. Sua pele estava fria ao toque, e não mudou a textura enquanto a ponta dos dedos passava por cima. Por que isso? Ela era menos receptiva do que a rochafluente? Ninguém teria dito isso duas horas atrás. Agora que sua paixão havia sido saciada, ela seria a mesma de antes?

 

* * * * *

 

Ertai rolava de um lado para o outro, procurando os braços de Belbe. Quando não a encontrou, ele abriu os olhos. Através da câmara, nos recessos sombreados do teto, ele viu o que parecia uma armadura negra se pendurando pelos pés no teto. A armadura se mexeu.


Ertai saltou da cama.


“Quem é? Desça, ou vou te derrubar!”


O riso estonteante foi sua resposta. O intruso caiu do teto, deu uma cambalhota, e aterrissou de pé.


“Crovax!”


“Parabéns garoto. Se encontrou com a emissária em termos iguais, não foi?”


“Por quanto tempo esteve lá?”


“O suficiente. Quem imaginaria que os soberanos enviariam um representante tão espirituoso?”


Ele passeou e pegou uma das roupas de Belbe. Ertai a puxou da mão dele. Crovax riu. “Agora você vai defende-la, como qualquer amante o faria.”


“Você é um animal nojento.” Ele estava amedrontado por Crovax ter descoberto dessa forma, seu medo se agravou por não saber o que Crovax faria com ele e Belbe.


“E você é um garoto estúpido, a performance de hoje foi irresistível. Foi um belo truque, admito isso. Seduzir a emissária é bom para sua candidatura.”


“Não foi isso o que aconteceu!”


Os olhos negros de Crovax brilhara. “Vai me dizer que foi amor?”


“Eu-eu não sei.”


Houve uma respiração profunda. Os dois homens viram Belbe de pé na entrada. Ertai pegou a primeira pela disponível – seu gibão – e apressou-se a envolvê-la.


“A resposta correta seria ‘sim’.”


“Cale a boca!”


Crovax se colocou de pé. “Você é bem-vindo a tentar fazer isso, garoto.”


“O que aconteceu entre nós não foi acerca amor humano. Eu tinha curiosidade sobre aprática da cópula, e Ertai estava me obrigando.”


“Estou vendo. Se tudo o que queria era experiência, poderia ter tido uma melhor.


Estou sempre disponível para iluminação de Sua Excelência.”


Ertai começou a avançar, mas Belbe o deteve.


“Não. Ele está tentando te provocar. Já vi isso antes.”


Crovax deu de ombros e sentou-se novamente. “Melhor escutá-la, garoto. Posso matar você a qualquer hora que quiser.” Ele estendeu a mão de repente. Ertai se encolheu, fazendo Crovax rir. “Você não é totalmente tolo. É esperto o suficiente para me temer.”

 

“O que você quer, Crovax?”


“Vim te dizer Sua Excelência que a ordem foi restaurada nas cidades da Fortaleza. Quando o exército retornou, coloquei soldados em cada praça, taverna, estalagem e lugar de reunião na cratera. Não haverá mais problemas.”


“Bom. Você pode ir.”


“Mais uma coisa, Excelência. Uma vez que mestre Ertai a obrigou, não acha que isso te prejudica na questão da candidatura dele?”


“Escolherei o novo evincar baseado em total habilidade, não em habilidade mágica ou militar – ou destreza biológica.”

 

Crovax deu um risinho e foi embora. Ele tinha dado alguns passos quando Belbe, se movendo com grande velocidade, correu atrás dele. Ela soltou um grito agudo e curto.


Crovax se virou, mas seus punhos encontraram somente o ar. Belbe atacou com o pé descalço. Pegou ele na lateral direita fazendo-o voar para trás, a couraça profundamente amassada pelo golpe.


“Belbe, não!” Ertai gritou.


Crovax se levantou com um pulo, e mobília de rochafluente entre eles se fundiu numa parede sólida espessa. Belbe não pôde parar sua corrida a tempo para evitar colidir com a barreira. Crovax sorriu, e a parede bateu em Belbe mais duas vezes. Ele estava prestes a esmaga-la contra a parede da Cidadela quando ela saltou por cima da parede e deu um chute direto na testa de Crovax. Ele caiu, mas o chão o ergueu de volta. Crovax tinha uma espada, mas ele não a usou. Ao invés disso, ele moldou o chão para prender Belbe – mas ele foi muito lento. Ela saltou para um pilar próximo feito de ferro natural – fora da influência de Crovax – e se agarrou lá pelas pontas dos dedos das mãos e dos pés, ofegante. Crovax tirou o peitoral, estremecendo com os golpes que havia tomado.

 

“Conseguiu o que queria, Excelência. Eu não devia ter te intimidado. Mas nos interesses – digamos, eficiência? – você vai definir uma data em que nomeará o novo Evincar de Rath?”


Belbe permaneceu no pilar, cabelo alvoroçado, parecendo uma das estátuas de Volrath. Ela respirou fundo, engoliu, e disse, “Vou definir a data.”


“Quando?”


“Daqui a dois dias. Exatamente ao meio-dia.”


Quando ele se foi, Belbe desceu. Ertai correu até ela, pensando em confortá-la. Ela estava tremendo dos pés à cabeça.


“Está tudo bem. Ele não vai machucar você. Ele não ousa, pelo menos até você escolher o novo evincar.”


Belbe não estava tremendo de medo. “Isso foi formidável! Eu queria destruí-lo com minhas próprias mãos!”

 

Sem falar, Ertai pegou suas roupas e rapidamente se vestiu. Belbe estava tão cheia de excitação que não percebeu até que ele começou a partir.


“Aonde está indo?”


“A biblioteca. Tenho muito o que ler. Meu exame final é em dois dias, não é?”


Ele bateu a ornamentada porta de rochafluente atrás dele.

 

* * * * *

 

Sargento Nasser esperava por Crovax na sala de conselho do evincar.


“Eu tenho minha conta da marcha do exército de volta para a Fortaleza, meu senhor.”


Ele disse isso, segurando um pergaminho fino. Quando Crovax não respondeu, ele pôs o pergaminho sobre a mesa.


“Onde está Greven il-Vec?”


“O chamaram para a nau. Alguma coisa sobre um intruso na planície oeste.”


“Entendo. Deixe que ele persiga tantos vagantes quanto quiser. Em dois dias, a emissária dos soberanos convocará uma assembleia especial. O propósito é nomear o novo Evincar de Rath.”


“A escolha é certa, meu senhor.”


“Assim você diz, mas nossa prezada emissária está sob todo tipo de pressão e influência. Em tais circunstâncias, ela pode não tomar a decisão correta. Não podemos deixar que isso aconteça.”


“Não, meu senhor.”


“Amanhã, quero que o Corpo dos Sargentos retorne à Cidadela – todos eles. Cada homem deve trazer sua espada, escudo, elmo e adaga.”

 

“Os guardas do palácio não permitirão tropas armadas lá dentro.”


“Então traga as armas escondidas! Use sua imaginação. A cerimônia será daqui a dois dias, ao meio-dia. Às dez horas que o Corpo dos Sargentos se reúna na antecâmara do evincar. Cheguem em dois e três – não venham de uma vez. Estejam completamente armados.”


Nasser assentiu. Ele sabia as intenções de Crovax, mas parte do preço de sua cumplicidade era fazer com que seu novo senhor e mestre falasse em voz alta.


“O que planeja, senhor?”


“A sucessão não pode ser deixada aos caprichos de uma garota.” Ele puxou sua adaga, segurou-a por um segundo, depois a cravou na mesa. “Diante de você e de todos os sargentos, a emissária nomeará o novo evincar ou morrerá. Seu amante, o garoto Ertai, morrerá também.”


Nasser cruzou os braços. “Será feito, meu senhor.”

 

* * * * *

 

Perturbada e desconcertada, Belbe fugiu das intrigas palacianas se retirando para a fábrica. Ninguém mais podia suportar por muito tempo o barulho do trabalho da rochafluente, tornando o lugar ideal para se esconder – em meio aos jatos de admissão, distribuidores centrífugos e reguladores de fluxo, ela encontrou serenidade. 

Assim ela pensou. Mesmo naquele lugar, Belbe era assombrada por vozes e memórias que ela não desejava. Sua vida, sua total existência ela devia a Abcal-dro e Phyrexia. Não havia o que argumentar. Porém, ela tinha o direito, assim como sugeriu Ertai, de existir por si mesma? Ela nunca pensou no que aconteceria a ela após sua tarefa em Rath estivesse terminada. Ela seria chamada para Phyrexia? A vida lá seria severamente circunscrita por sua necessidade de um ambiente sem poluição. Ela poderia viver sob o domo de Abcal-dro assim como um dos animais de Volrath,
sempre sob o olhar de seu mestre polimorfo?


Claro que não, se dependesse dela.


Ela poderia ficar em Rath? Esta opção tinha aspectos positivos e negativos. Uma vez que um evincar fosse eleito, ela não teria mais papel a desempenhar. Belbe poderia ficar como conselheira do novo governador, mas a tolerância por sua posição parecia duvidosa. Talvez ela poderia encontrar um papel menor na Cidadela – mantendo a facilidade de produção de rochafluente, por exemplo.


Não, até mesmo esse serviço estava destinado a ser curto. A conjunção de Rath e Dominária estava perto. A invasão final começaria então e ela se perderia na onda de destruição total de Phyrexia.


Belbe olhou através da cúpula para o fluxo de energia que jorrava no centro artificial da cratera. Além daquilo, como um fantasma tingido de azul, estava o pináculo do palácio, coberto pela doca de desembarque do Predador.


O Acelerador quebrou seu devaneio. “Fluxo de saída está submáximo. Incrementando saída a 114 por cento.”


Distraidamente, Belbe mexeu no medidor de saída para 86 por cento e recalibrou para leitura de 100. Toda a fábrica tremeu com a alteração. O Acelerador aceitou a informação, “Aumentando a saída para 114 por cento.”


Sua mão estava no mostrador. O que isso sugeria?


Ela tinha apenas um pouco de conhecimento do mecanismo planar, mas ela sabia o suficiente para compreender que, lentamente, Rath e Dominária estavam adentrando nas mesmas coordenadas planares. Quando elas combinassem, os mundos se entrelaçariam e se tornariam um. Rath sobreporia em cima de Dominária e seria a cabeça-de-praia das forças Phyrexianas.

 

Ela olhou para o mosaico de mostradores e alavancas, e a imagem dos reféns massacrados encheu sua visão. Todas aquelas pessoas, aqueles inocentes, súditos leais, mortos para agradar a fome de vingança de um homem. Como era a diferença, sua mente lógica e sem remorso continuou, permitir o Escondido saciar sua fome por poder com as vidas de inocentes de Dominária?


Qual era a diferença? Qual?


“Não há diferença,” ela declarou bem alto.


O fator crucial na congruência entre Rath e Dominária era a massa. Os dois mundos ocupavam o mesmo nicho interspacial, mas Rath não tinha massa suficiente para afetar o mundo mais antigo e naturalmente criado. A maior massa de Rath, quanto mais lenta sua taxa ficava, até que finalmente ela ficasse na mesma taxa de Dominária. Era por isso que a fábrica de rochafluente tinha maior prioridade nos recursos de Rath – cada camada de nanomáquinas, não importa o quão finas elas parecessem, aumentava a massa de Rath e acelerava o dia da junção dos mundos.


E se não acontecesse? Se faltasse massa a Rath para sobrepor, permanentemente,


Dominária?


A mão de Belbe ainda estava sobre o medidor de saída. Ela podia fazer uma escolha – a escolha – por Rath. Se a conjunção final falhasse, Rath poderia ser mudado. O governo absoluto do evincar se dispersaria. Negociações com os rebeldes colocariam um fim as guerrilhas. Lei e razão tomariam lugar do governo. Os soberanos certamente revidariam, mas antes que isso acontecesse, o desequilíbrio de energia em Rath poderia ser invertido, resultando num ambiente tóxico para qualquer potencial de invasores Phyrexianos. Ertai conhecia o bastante de magia para ajudar nisso. Infelizmente, por todos seus talentos, Ertai não era páreo para Crovax. Ela não podia  depender dele para alterar o destino de Rath. Greven era mais capaz, mas seu dispositivo de controle o prevenia de se opor abertamente contra Crovax. Dorian e a corte eram inúteis. O real poder para mudar as coisas estava nas mãos dela. Belbe tocou levemente as Lentes. Ertai disse que ofuscou o implante. Ela ousaria acreditar nisso?

 

Ela tinha que acreditar. Belbe não suportaria enfrentar sua vida, mesmo que fosse curta, sabendo que ela era responsável pela destruição de dois mundos e a morte de milhões. Ela ajustou o medidor de saída para 50 por cento. Luzes de alerta brilharam por toda a fábrica até que ela ordenou que parassem. Belbe recalibrou rapidamente o medidor para ler 100. Se ela pudesse manter o fluxo subnormal até o tempo previsto da conjunção, a massa de Rath seria muito baixa para sobrepor Dominária.


Ela tinha certeza que ninguém na Cidadela perceberia isso. O medidor teria que ser ajustado diariamente para que a redução de saída continuasse mantida, do contrário, a autorregulação da fábrica compararia a produção de rochafluente e a corrigiria.


Como Belbe já visitava a fábrica constantemente, ninguém suspeitaria das suas idas e vindas.


Assim que ela desativou o sistema de alarme, o Predador adentrou a cratera. A cúpula vibrou com a poderosa aeronave circulando o feixe de energia. Belbe observou a embarcação deslizar e ancorar, fechando as asas contra o casco. Ela terminou suas alterações e deixou a cúpula.


Assim que alcançou o corredor central do palácio, Greven il-Vec e sua tripulação chegaram. Belbe percebeu entre a tripulação habitual uma figura alta, envolta numa capa marrom até o chão e um capuz. Ninguém na tripulação estava tão vestido. Ela usou sua visão infravermelha para ver através do disfarce, mas descobriu que não conseguia penetrar a simples capa.


O que estava acontecendo aqui?


Curiosa, ela alterou seu caminho para se encontrar com Greven.


“Excelência,” Greven disse, se curvando.


“Saudações. O que achou da embarcação reparada?”


“Parece boa, embora ficarei feliz quando o armamento estiver de volta. Escoltar é uma coisa fraca para um navio de guerra como o Predador.”


Toda a tripulação esperava sob a sombra de Greven – todos menos a figura coberta.


Ele deslizou para o lado, como se aquilo fosse passar despercebido. Belbe entrou diretamente na frente dele.


“Eu te conheço?”


O encapuzado olhou avidamente para Greven.


“Excelência, isso é um assunto delicado. Preferiria explicar para você num lugar menos público.”

 

“A sala está vazia, acredito.”


As portas da sala de convocação – antes a sala do trono do evincar Burgess – era consistida de uma série de discos gigantes rolando juntos para formar uma barreira.


Ao comando de Belbe, a porta enorme se abriu.


“Então?”


“Sua Excelência sabe que temos uma rede de espiões e assassinos operando fora da Cidadela? Este é um de nossos agentes.”


A figura encapuzada mante distância, de pé e com as mãos cruzadas. Belbe tentou outra vez ver através da pesada capa, mas sem sucesso. Ela tinha a impressão que a pessoa debaixo da capa a estava evitando, se alterando quando ela tentava identificar.


Foi uma experiência inquietante.


“Há mais alguma coisa que você deseja?” Greven perguntou impacientemente.


“Deixe-me ver seu rosto.”


“Excelência-”


“Deixe-me ver seu rosto.”


Mãos enluvadas ergueram-se e dobraram a borda profunda do capuz. Uma cabeça magra e felina surgiu, com um cavanhaque fino e lábio superior bifurcado. O companheiro misterioso de Greven era um Kor.

 

Ele pressionou a mão contra seu peito, de maneira formal, e disse, “Sou Furah, chefe dos Pescadores da Vida.”


“Furah não deve ser reconhecido dentro da Cidadela. Comprometeria sua segurança como nosso agente.”


“Certamente. Obrigado por satisfazer minha curiosidade.”


Belbe partiu e Furah ergueu seu capuz outra vez.


“Bem simples,” disse o Kor. “Ela não será problema.”


“Não a subestime. Ela pode parecer uma criança, mas foi feita pelos soberanos e tem muitos talentos.”


“Você ficou cauteloso, Greven. Não costumava ser.”


“Estamos jogando um jogo perigoso. Eu dou valor a minha vida, por mais miserável que seja.”


“Não me traia, Greven.”


O guerreiro amargo ergueu o queixo e respondeu, “Não traio ninguém! Apenas entenda, essa aposta é sua, sua luta. Não vou te atrapalhar – mas também não posso te ajudar muito.”

 

Greven se ausentou. As portas se abriram para ele. Furah permaneceu na sala de convocação por um tempo, contemplando a tapeçaria e baixos-relevos de comemoração dos atos dos evincares anteriores.

 

* * * * *

 

Dez rebeldes, vestidos com uniformes das tropas de Rath, caminhavam pelo platô seco. Os seis Dal eram liderados por Teynel en-Dal, o sobrinho de Darsett, usando o elmo de um combatente de Rath. Os quatro Vec seguiam Lin-Sivvi, agora disfarçada como uma mulher Vec. Ela cortara seu longo cabelo preto perto do couro cabeludo e colocou uma atadura de sangue para ajudar no disfarce. O sangue era real – Sivvi tinha pego a atadura de um soldado. Sua arma ancestral, o totem-vec, ficou enrolada por baixo da atadura na cintura. O totem-vec se consistia de alça de osso, com seis pés de couro de pele de cobra trançado e moldado como elos de corrente, uma ponta dubla na extremidade e uma lâmina de faca de dois gumes com oito polegadas de comprimento.

 

O chicote de pele de cobra foi passado por um buraco na base da faca. Por causa dos nômades Vec que tinham pouco acesso ao bom metal, eles desenvolveram armas como o totem-vec ao invés de espadas tradicionais. Um portador habilidoso poderia cortar a garganta de inimigos a seis pés de distância ou arrancar um olho com um movimento do pulso. Sivvi era conhecida como mestre do chicote-face, daí seu título “Lin”, o qual significa literalmente “notável víbora”.

 

Eladamri, vestido em trapos, estava sentado nas costas de um kerl com as mãos algemadas. Ele tinha uma cópia da chave escondida em sua cinta, assim ele poderia se libertar se necessário. Ele estava desarmado e com a cabeça descoberta. O alto cone da Fortaleza rompeu o horizonte de prata. Eles ainda estavam a um dia de caminhada.


Os rebeldes estavam entediados. Por um tempo eles cantaram, os Dal ensinando aos Vec suas canções, e os Vec retornando o favor com seu próprio repertório. Depois de algumas horas as canções se esgotaram e as gargantas ficaram secas. Eladamri impediu que trouxessem rações de água. Eles deviam ser retardatários, sobreviventes e não um grupo bem equipado. Se chegassem com os pés doloridos e secos, ajudaria mais na encenação.


Teynel olhou e disse. “Nenhum sinal da nau voadora. Eu esperava que ela nos visse e nos pegasse.”


“Está louco? Você não me colocaria naquela máquina voadora!” respondeu Lin Sivvi.


“É melhor do que andar.”


“Aquela máquina é uma criação não natural. Algum dia, os deuses a derrubarão dos céus!”


“Que derrubem, mas até então, prefiro voar do que caminhar,” disse Teynel.

 

“Quer a besta?” Eladamri disse, segurando as rédeas do kerl.


Envergonhado, o jovem Dal recusou. “Eu não pediria que Sua Senhoria caminhasse.”


“Não sou lorde. Também não me importo com qualquer posto. Me chame de Eladamri, ou irmão ou qualquer outra coisa.”


“Pensei que apenas os elfos se chamavam de irmãos,” disse Sivvi.


“Qualquer um que lute ao me lado pode me chamar de irmão.”


Isso acelerou o passo dos rebeldes. Eles cobriram um amplo espaço ao meio-dia quando eles pararam para uma refeição ao estilo dos soldados de Rath. Um dos Dal avistou uma coluna de pó subindo na distância.


“Alguém está vindo.”


“Fiquem em seus lugares. Vocês não devem estar alarmados pela vista de seus companheiros de Rath.”


A origem da poeira era por uma centena de Kor, homens, mulheres e crianças, marchando e carregando tudo o que possuíam nas costas. A visão era incomum e até Eladamri se pôs de pé. Ele sussurrou algumas palavras para Teynel o qual parou o grupo Kor.


“Parem! Quem são vocês?”


Quatro Kor homens, carregando uma maca nos ombros, se curvaram até o chão. As mulheres se agacharam na grama com as crianças. Um ancião Kor se aproximou de Teynel.


“Saudações, soldado de Rath! Sou Theeno e estes são meu povo, os Pescadores da Vida.”


“Aonde estão indo?”


“Para as montanhas ao sul, bravo soldado. Nosso chefe está morto e devemos deixar nossos lares na Montanha do Fogo Azul.”


Agora Teynel entendia. Muitos povos vivendo do lado de fora da Fortaleza a chamavam de Montanha do Fogo Azul.


“Por que devem partir?”


“Era o desejo do nosso chefe moribundo. Ele era bem conhecido do seu comandante, Lorde Greven.”


Teynel caminhou até Theeno. O corpo de um Kor de meia idade jazia na maca, envolto numa mortalha diáfana. Entre o colarinho e os quadris, uma escura mancha marrom estava encharcando toda a mortalha.


“Este homem morreu violentamente!”


“É verdade, soldado de Rath. Nosso chefe queria se encontrar com os lordes da cratera, como era seu costume, só que dessa vez ele voltou com essa ferida mortal.”


Eladamri se colocou de pé sobre o corpo. Ardil ou não, ele tinha que saber quem estava morto na maca.


“Perdoe-me, não quis desrespeitar...” O elfo lorde se ajoelhou e virou a mortalha.

 

O morto era Furah.


Eladamri o cobriu novamente e se colocou de pé. Ele franziu a testa para Teynel.


“Sigam seu caminho. Temos que entregar este prisioneiro para Lorde Greven.”


O Kor encarava Eladamri com olhos vorazes. “Este é Eladamri? Ele é um inimigo.


Entregue-o para Lorde Crovax. Ele vai despachá-lo assim como fez com os outros.”


Sivvi deu um passo à frente. “Que outros?”


Theeno sorriu, mostrando dentes proeminentes. “Lorde Greven ajuntou seis mil reféns do povo da cratera para manter os reféns contra aqueles que ajudassem os rebeldes da floresta. Quando Lorde Crovax retornou da batalha, ele nos poupou, os Pescadores da Vida. Ele sabia que éramos seus súditos leais. O resto-” Theeno ergueu dois dedos e fez um movimento de apunhalamento.


“Eles queimam agora.”


“Crovax matou todos?”


“Todos menos os Pescadores da Vida. Nosso chefe era amigo de Lorde Greven, e assim fomos poupados da fúria do grande senhor.”


Teynel ordenou outra vez que os Kor se movessem. Os carregadores ergueram o corpo de Furah nos ombros e, com muita agitação de poeira e sem falar, os Pescadores da Vida partiram.


Quando estavam longe o suficiente para ouvir, Sivvi explodiu.


“O carniceiro! Seis mil pessoas – seu povo, da sua própria cidade – mortos de uma vez! Que tipo de demônio estamos lidando, Eladamri?

 

“Aparentemente um com grande sede de sangue.”


Ele dividiu o olhar entre os Kor que se retiravam e o cone distante da Fortaleza.


“Pensei que Volrath era implacável e cruel, mas este Crovax pode ser somente puro mau." 

Minhas propostas ao povo da cratera foram totalmente ignoradas. Achei que estivessem muito amedrontados ou confortáveis para lutar contra seus opressores. Agora, Greven e Crovax mataram seis mil. O Oráculo en-Vec viu isso acontecer, mas ela não conseguiu descrever para mim, foi muito terrível. Foi um crime hediondo, mas ainda podemos usar em nosso favor. Se eu enviar agentes a cratera novamente, talvez a resposta seja favorável à nossa causa. Pareço insensível?

 

“Um pouco. Encontra vantagem numa catástrofe é algo frio.”


“Uma revolução não é uma dança de salão. Não podemos salvar aquelas que já morreram, mas podemos fazer pagar os assassinos. Vejam claramente o que estamos fazendo, todos vocês. Isto não é um jogo ou uma briga por honra. É um lance sangrento e maldoso. A diferença entre nós e Crovax e Greven é que fazemos o que fazemos para por um fim a opressão e derramamento de sangue. Para eles, violência é uma maneira de viver e sempre será.”

 

Eles seguiram a trilha dos Pescadores de volta à Fortaleza. Isso deu a eles um caminho claro e ajudou a esconder suas pegadas em caso do Predador ou dos soldados os descobrissem. A notícia do massacre deu nova força a eles. Teynel propôs que caminhassem a noite toda e ninguém se opôs.

 

* * * * *

 

Dorian il-Dal saiu dos aposentos pela primeira vez três dias depois do massacre dos reféns. Ele não dormiu nesse tempo todo. A fome finalmente o fez sair e ele caminhou pelos salões da Cidade, tentando lembrar onde era a cozinha. Tudo o que encontrou foram guardas pelo corredor que disseram qual caminho a seguir, mas ele sempre acabava esquecendo depois. Após um guarda sentir pena dele, dar um biscoito salgado a ele, o camareiro vagou deixando uma trilha de migalhas brancas.


Após isso ele sentiu sede. Dorian tentou encontrar algum lugar para matar sua sede, mas ao bater nas portas das despensas não encontrou ajuda de ninguém. Ele começou a chorar, fungando, ele se arrastou e sacudiu as maçanetas das portas, resmungando por água. Depois de tentar mais de trinta portas, ele encontrou uma porta que parecia demonstrar movimento lá dentro. Dorian limpou as lágrimas na expectativa de que alguém lhe desse água.


A sala era pequena e larga, com teto baixo e estriado. Dorian entrou, mas tropeçou no seu roupão, caindo de joelhos. A porta se fechou atrás dele e uma luz se acendeu. Ele estava cercado por homens fortes. Armas estavam empilhadas no piso – espadas, peitorais, elmos. Quando ele ergueu a cabeça ele viu quem segurava a lâmpada.


Crovax.


“Ah! Socorro! Socorro!


Crovax mandou que silenciassem Dorian. Uma mão calejada cobriu a boca do camareiro, e punhos bateram nas costas e barriga. Arquejando, Dorian caiu no chão e choramingou.


“Fique quieto e ninguém baterá em você. O que está fazendo aqui?” Crovax perguntou.


“Quero beber água.”


Os sargentos trocaram olhares intrigados. Nasser e Tharvello o ergueram do chão e deram-lhe um banquinho. O rosto do camareiro estava marcado pelas lágrimas.


“Qual é o problema dele? Tharvello se perguntou alto. “O velho tolo nunca fora um guerreiro, mas nunca o vi vagar por aí chorando.”


“Ele parece angustiado.” Crovax disse, se erguendo. Dorian se encolheu diante do movimento dele. Crovax deu um sorriso iluminado pela lâmpada em sua mão.


“Sou eu, não sou? Eu te assusto, Dorian?”


Ele fechou os olhos e mexeu a cabeça furiosamente. “Posso ter um copo d’água?”


Nasser olhou para Crovax que deu de ombros. Um sargento entregou a Dorian uma garrafa. O camareiro bebeu com avidez, água escorrendo pelo queixo.


“Basta,” disse Crovax. A garrafa foi tirada e Dorian chorou quando não conseguiu alcançá-la.


“Fique quieto!”


“Me desculpe. Por que estão se escondendo aqui?”

 

“Quem disse que estamos nos escondendo?”

 

Dorian apontou para as armas. “Vocês não deviam trazer armas para o palácio.”


“Sua mente não te abandonou por completo,” Crovax disse, colocando a lâmpada na mesa. “Que pena. Como um idiota, você era inofensivo. Como uma testemunha, você é um perigo.”

 

O que quer que estivesse errado com Dorian, ele sabia quando estava em perigo. Ele tentou se levantar, mas seis sargentos o forçaram a ficar no lugar

 

. Ele tentou berrar, mas alguém colocou um pano em sua boca.


“Segurem ele,” disse Crovax. Ele sacou um punhal de dois gumes do seu cinto.


Os olhos de Dorian se arregalaram em terror. Ele lutou febrilmente para se levantar. 

 

Crovax pressionou a ponta afiada do punhal sob o queixo de Dorian. O camareiro perdeu a cor e parou de lutar. Crovax olhou para o homem indefeso e manteve a mão.


Ele se virou para Tharvello e, então, arremessou o punhal para o jovem sargento.


“Faça você.”


“Por que eu?”


“Porque eu mandei.”


Tharvello colocou o punhal na garganta de Dorian. Assim que a lâmina estava prestes a cortar a pele do camareiro, Crovax berrou.


“Pare!”


Todos olharam para ele. Crovax ergueu a mão e apontou para a arma. Tharvello colocou primeiro o cabo na mão de Crovax.


Num movimento rápido, Crovax fechou sua mão ao redor do cabo e cortou na horizontou com o punhal. Ele cortou uma garganta com um golpe limpo, mas não era a de Dorian. Tharvello recuou contra seus companheiros sargentos, sangue jorrando do peito.


“Traidor! Você pretendia me entregar para Greven e aquele verme do Ertai!”


“O que?” A pergunta de Nasser ecoou em cada homem na sala.


Crovax colocou a mão na túnica de Tharvello. Um pérchero saiu com as pernas e asas amarradas. Crovax o ergueu e mandou que falasse.


“‘Eu sirvo a Rath, não a qualquer homem,” a criatura repetiu.


“Suas palavras?” Crovax perguntou a Nasser.


“Minhas, mas eu disse mais do que isso.”


“Está certo.” Crovax deu um pequeno tremor no pérchero, e ele falou outra vez.


“Se você pensa que Crovax está acabado, está terrivelmente enganado. Derrotado ou não, ele retornará mais forte do que nunca. Marque o que digo.”


Crovax esmagou o pérchero e o jogou em cima do que sobrou de Tharvello.


“Muito presciente de você, Nasser. Nosso amigo Tharvello gravou o que você disse e foi até Greven com isso. Quando Greven se recusou a agir baseado no que ouviu e nomear Tharvello chefe do Corpo dos Sargentos – sobre seu cadáver “aposentado”,

 

Nasser – Tharvello jurou que levaria o pérchero até Ertai e a emissário. Como se constata, tenho certa influência com Greven, e ele revelou toda a história sórdida para mim.”


Os olhos de Tharvello reviraram. Sua carne ficou da cor de um pergaminho novo. Do seu banquinho, Dorian ergueu seus pés para não deixar o sangue tocá-lo.


“Vocês descobrirão que sou tolerante com muitas coisas. Embriaguez, duelos, apostas – essas são recreações normais para os homens. Contanto que não comprometam com seus deveres, não me importo com o que vocês façam. Posso até tolerar falha.


Nós todos falhamos, agora e depois.”


Ele rir, embora ninguém mais se ajuntou a ele.


O que não tolerarei é a traição. Este é o destino dos traidores. Ele chutou o corpo ainda quente de Tharvello. 

 

“Sabem por que dei a faca primeiro para ele? Para dar a ele a chance de me matar. Se ele tentasse me derrubar com um golpe, eu o teria poupado. Assassinos eu posso usar. Traidores são apenas uma carniça.”


“Sabem seus lugares na operação de amanhã. Vocês são os melhores homens de Rath, os melhores guerreiros e verdadeiros líderes. Quando eu for evincar, todos vocês compartilharão da minha vitória.”


Nasser ergueu o punho em saudação. “Crovax! Vitória!” Os sargentos continuaram.


“Crovax! Vitória!”


Dorian engoliu a bile na garganta e resmungou, “Crovax, vitória.”


“Oh, sim, o camareiro. Quase esqueci de você.”


Ele agarrou Dorian pela garganta fina e o ergueu no ar. O corpulento camareiro pesava quase o mesmo que dois homens, mas Crovax o ergueu com apenas uma mão. Os olhos de Dorian saltaram e espuma se formou em seus lábios.


“Não posso mais confiar em você. Você sempre foi um tolo, mas uma vez você teve bom senso para manter a boca fechada. Perder sua sagacidade te custou a vida.”


Ele arremessou Dorian contra a porta de rochafluente que o agarrou com rapidez. Os painéis da porta fluíram para fora, agarrando a cabeça, braços, cintura e pernas de Dorian.


Crovax mexeu o punhal entre os dedos. “Prestem atenção, mostrarei a vocês que o golpe que usei com Tharvello não foi por acaso.”

Leandro Dantes ( Arconte)
Leandro conheceu o Magic em 1998 e, desde então, se apaixonou pelo Lore do jogo. Após retornar a jogar em 2008, se interessou por lendas, o que resultou por despertar a paixão pela escrita. Sempre foi mais colecionador do que jogador e sua graduação em Pedagogia pela Ufscar cooperou para que ele aprimorasse e desenvolvesse um estilo próprio. Autor de alguns contos, todos relacionados ao Magic, já traduziu o livro de Invasão e criou sua própria saga com seu personagem, conhecido como Arconte.
Redes Sociais: Facebook
Comentários
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(Quote)
- 12/02/2019 12:55:22

Aposto que ele não vê a hora de chamarem o Uginzord

(Quote)
- 11/02/2019 21:13:57

Blackanof não sentiu falta dos Power Rangers? :o

(Quote)
- 11/02/2019 13:10:43

Eu que o diga rsra

(Quote)
- 11/02/2019 13:10:27

Quando Gerrard foi buscar Hanna em Tolaria, eles queriam ajuda de Barrinha, mas como o mago mestre não podia sair da escola ele enviou seu melhor pupilo. Realmente, Ertai fora um mago prodígio

(Quote)
- 11/02/2019 13:09:29

Quem diria que um dos maiores magos teve um romance Phyrexiano

Ertai será transformado por vontade própria, então ele lembra sim. Na carta, Travessura de Ertai, ele demonstra o ressentimento pela tripulação

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